TAMBORES DA TERRA VERMELHA
(por Adail Vilela)
Antônio Francisco de Jesus (Saracura) lança mais um livro, atendendo ao apelo de seu coração, de suas origens: “Há agora tambores ruflando longe, em volta (chega incomoda o presente) convocando os filhos que finalmente aprenderam a cantar e a relatar. A epopeia desse povo guerreiro não pode ser esquecida. E ainda é tempo!”
O autor dos excelentes OS TABARÉUS DO SÍTIO SARACURA, MENINOS QUE NÃO QUERIAM SER PADRES e MINHA QUERIDA ARACAJU AFLITA, lança agora um novo título, dividido em três partes: Adeus, velho rincão; Jeitos de viver e de morrer; e O inusitado e o sobrenatural. Porém, antes de falar da obra, considerei muito simbólica a presença do Cônego Carvalho no lançamento de TAMBORES DA TERRA VERMELHA. Quem leu MENINOS QUE NÃO QUERIAM SER PADRES entende (ou entenderá, se bateu a curiosidade de ler)...
O glossário é um item de primeira necessidade para os desacostumados com o rico linguajar típico do interior sergipano, mas não dá conta... ou sabe o leitor o que é decretado (p. 14), requevém (p. 16), macacoa (p. 18), breguessos (p. 20), cutim (p. 21), facho (p. 25), frechal (p. 27), testo (p. 27), cantareira (p. 27), moguento (p. 47), bigu (p. 57), encangotar (p. 97), croá (p. 133), rascou (p. 143), galinha maninha (p. 195), godoro (p. 226)?
Saracura, referindo-se ao sítio da infância, afirma que “não existe nada melhor do que o que se produz naquele sítio abençoado, haja vista nós.” Modéstia a parte... Vejam que conto curioso: um primo estaria ficando broco, sua esposa (irmã do autor) advertira. O primo retruca: “Sua irmã é quem está broca. Você sabia que o primeiro sintoma do broco é espalhar que outra pessoa (esposo, amigos) está ficando?” E o escritor se questiona: “E agora? Pelas minhas contas, ambos (ele e a esposa) estavam espalhando... Até eu estou também aqui.” E eu...
Adiante temos o que, acredito, seja o primeiro registro literário de uma das mais típicas interjeições sergipanas: “Ah! Pois”. E o impagável duelo de espertezas de Fim de turno? Saracura tem um jeito peculiar, original, de pontuar, que torna muito vivo o texto, isto é, transmite o frescor de um bate-papo íntimo. Exemplificando: “Contei-lhe um pouco de mim, incluindo algumas esquisitices bisonhas, clareando seu céu, quem sabe, duvidoso. Achei!”
A parte III é toda muitíssimo interessante, um registro parte folclórico, parte mítico, de grande riqueza cultural. O Papa peito, por exemplo, é um conto de estranho magnetismo, que você lê boquiaberto e finaliza com um arrepio. O último conto do livro, Distintos povoados, está inserido na terceira parte (O inusitado e o sobrenatural) por artes do escritor, isto é, não se enquadra, tematicamente, nem por sobrenatural nem por inusitado, mas por talento... Mistura localidades, política, parentesco, futebol, futuro e sonhos. De fato, são muitos tambores da terra vermelha, mas acabou... “ora, já se viu!”