OS TAMBORES DA
TERRA VERMELHA
Vladimir Souza Carvalho ///
Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras.
O
silêncio se quebra porque o barulho é forte. Mas, não é barulho de bomba, nem
de trio elétrico, nem de aparelho de som embutido em carro da mocidade
festeira, nem de buzina de veículo. Aliás, não é nem barulho, mas som ritmado
que os satélites e radares secretos apontam para a Terra Vermelha, embrenhada
na Itabaiana dos nossos amores, e, então, as mensagens, que os serviços de
inteligência trocam, direcionam para o ponto chave: o barulho é provocado por
tambores. Bom, tambores, bem mais marcial, bem mais selvagem que a minha
percepção calculava. Era capaz de jurar por todos os santos que figuram nos
altares da Matriz de Itabaiana que, em verdade, os serviços de inteligência
estão errados: o som não é de um tambor, nem de dois, nem de três, nem de
número algum. Esse som é de uma orquestra sinfônica. E, acrescente-se, não é
barulho, nem som solitário, é música, e, melhor ainda, da boa.
É
assim que encaro Tambores da Terra
Vermelha, último livro de Antonio Francisco de Jesus [Aracaju, Info
Graphics Gráfica e Editora, 2013, 252 pp], continuação implícita da saga
iniciada com Os tabaréus do Sítio
Saracura, superlotado pelos casos vistos e vividos, no desfile de fatos e
de pessoas, na vida monótona e difícil dos que não conseguiam se situar
além de sua propriedade, trazendo à tona ocorrências corriqueiras, como a
aquisição de uma carroça de burro, a compra de um jipe, entre outras, que
ganham sal e pimenta com a sua exposição, como se fossem os fatos mais
fantásticos e inusitados do mundo.
O autor, na pele de quem teve de voar para se
libertar do campo, batiza o narrado como contos. No momento de espremer o
limão, o sumo que cai é outro, na exposição de um cenário com raízes firmadas
na reiteração hoje do dia de ontem, englobando aquilo que, dentro de casa, no interior
da propriedade, nas estradas para Itabaiana, ontem se fixou em sua mente, a
ponto de hoje, transforma-los num excelente prato para a sociologia da história
privada da Itabaiana rural, na abundância de situações e circunstâncias, que
mostram como, até bem pouco tempo, uma família numerosa, como quase todas, se
movia no seu dia a dia e no que ocorria ao seu redor.
Antonio
Francisco de Jesus, de memória privilegiada, é um autêntico filho da Terra
Vermelha, homem que a infância modulou, e nem os estudos em seminário e em
curso superior, nem a vida na cidade grande, nada o libertou da característica
de tabaréu do sítio Saracura. Contudo, se a natureza não lhe concedeu vocação
para, também, como o pai, ser agricultor
e vendedor de farinha na feira do Aracaju, o fez leitor de bons livros, e,
depois de muita leitura, escancarou as portas para a arte de escrever,
enchendo-o de talento para contar as vivências da infância e outras mais, o que
torna sua narrativa mais real e importante, porque é um homem do interior que
fala de seu mundo, sem ocultar nenhuma víscera.
Evidentemente
que Tambores da Terra Vermelha é
muito mais do que essas palavras traduzem. É só lê-lo
para constatar a veracidade do afirmado.
Correio de Sergipe, 28 de setembro de 2013.